Pensar o Sistema Escolar - quinze anos depois
(Foi em 2015 que editei este texto pela última vez e publiquei-o com a seguinte introdução: Desafiado por uns quantos amigos, decidi reeditar este texto escrito em 2005 e que inseri no correntes, em 29 de Novembro de 2005; antes da publicação no blogue foi publicado no site das novas fronteiras, no expresso online e na edição impressa da gazeta das caldas em 25 de Novembro de 2005, p.21)
Mas não só em modelos indutivos deve assentar a construção das ideias e dos métodos. Recordo as palavras, não literalmente, do Presidente da República Portuguesa quando visitou a Noruega, em 2004: "os noruegueses apostam muito na organização e quando têm que gerir alguma coisa não têm imensas ideias, apostam antes em poucas alavancas e escolhem aquelas que resultando de uma aturada análise lhes parecem as chaves que arrastarão tudo o resto".
Ora é precisamente isso que é necessário fazer no sistema escolar em Portugal. Temos assistido a um somatório de discussões e polémicas que invariavelmente aumentam o trabalho burocrático dos actores da escola mas que não introduzem qualquer alteração estruturante e significativa. Na maioria das vezes, alimentam apenas os conteúdos necessários para as agendas mediáticas dos órgãos difusores de informação.
Mas a ideia da simplificação não é nova nem de modo nenhum peregrina. Cruzei-me com esta tese nos primeiros anos como docente.
A maioria das escolas, dos 2º e 3º ciclos e do ensino secundário, em Portugal consome 90% da sua energia a tratar dos problemas da sobrelotação. É com se uma família tivesse dez filhos e habitasse uma só assoalhada servida por uma casa da banho. Lá teria o pai que advogar a falta de autoridade ou a mãe de remeter o problema para a complexidade do regulamento interno ou, quiçá, da internet ou da televisão. A questão do sistema escolar em Portugal, e aquilo que o afasta das escolas dos países do chamado primeiro mundo, é a sobrelotação das instalações e o desgraçado regime de desdobramento.
As crianças e os jovens deveriam ter as aulas no período da manhã e as actividades de complemento no início da tarde. Não conheço professor que se resigne ao facto dos seus filhos frequentarem o turno da tarde. E se falo de docentes, posso, também, referir os filhos das famílias capazes de pressionarem as instituições escolares. E os filhos dos que não sabem que o podem fazer? São esses os que abandonam cedo a escola e os que contribuem para os nossos maus desempenhos nos testes internacionais. Em regra é assim.
O que podemos fazer?
Eliminar, como medida inadiável e prioritária, os horários de desdobramento nas escolas, garantindo que nenhum estabelecimento de ensino funcione nesse regime e que o número máximo de alunos por turma se situe em próximo dos 20.
Mas o sistema é despesista. Nisso estamos todos de acordo. E é despesista, porque, como diz o arquitecto Nuno Teotónio Pereira, e muitos outros especialista o seguem, Portugal tem 38 quadros de divisão administrativa do território e não um como seria moderno e razoável. O que se pouparia aí em recursos financeiros e em capacidade de planeamento regional da carta educativa leva a que se considere o objectivo primordial de fácil realização.
Uma outra ideia fundamental e de alcance estratégico inquestionável passa pela estafada reforma da administração pública. Mas qual o cerne dessa reforma na educação? Muito se tem falado da avaliação do mérito. Mérito de quem?
Olhemos para os concursos de professores para o ano lectivo 2003/04: quem os desenhou propalava o primado da competência da gestão privada. Todos sentimos arrepios.
Encontramos na rede multibanco do sistema bancário o paradigma daquilo que deve ser feito. Importa que o poder central consiga criar os métodos de gestão da informação em tempo real e que estabeleça as redes com as escolas.
Chega de discutir a gestão escolar do modo ingrato, para os docentes claro, que todos conhecemos?(...)Por incrível que possa parecer, nem em 2005 a gestão financeira das escolas passa pelas redes informáticas. Culpa de quem? A maioria das escolas recorre ao software de empresas supostamente especializadas ou constrói as suas próprias bases de dados. E o poder central? Para que serve? Como pode falar de competência em gestão quem nunca o fez de modo eficiente. É como na gestão da casa de cada um de nós: só devemos gastar aquilo que temos e não confiar na bondade do que está escrito nas estrelas. E para isso devemos estar bem informados e em tempo útil. O gestor decisivo é o método e não apenas o académico.
Estão aqui três ideias fundamentais. Investir fortemente no desígnio de eliminar a sobrelotação das escolas e das turmas e considerar como prioritários os horários dos alunos no sentido do rendimento pedagógico. Administrar o território com objectivos claros, mensuráveis, consensuais e modernos e legitimados pelo sufrágio universal. Recorrer às novas tecnologias da informação, criando a rede das escolas através da disponibilização dos indispensáveis instrumentos de gestão - vulgo, bases de dados. Com estas três medidas arrastaremos as outras todas: pedagogias mais ou menos directivas, manuais mais ou menos escolares, professores melhor ou pior formados, exames só nos anos terminais ou nos anos todos. Eu sei lá. Ficaremos parecidos com um país a sério e mais aproximado dos ideais democráticos. Mais do que gestores, o que precisamos é de instrumentos modernos de gestão.
Acordem senhores! Virámos de século, a aldeia é global. Dez anos que sejam, um ligeiro piscar de olhos na vida de uma sociedade.