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Correntes

da pedagogia e em busca do pensamento livre

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"Iniciámos um círculo virtuoso ou não saímos do vicioso?"

19.04.21

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"Iniciámos um círculo virtuoso ou não saímos do vicioso?"

Pelo Público em 19 de Abril de 2021; como acordado, publiquei-o no blogue e acrescentei-o aqui.

Título: Iniciámos um círculo virtuoso ou não saímos do vicioso?

Lide (lead): A persistente erupção de intermináveis casos, e de megaprocessos judiciais, faz temer a prevalência de práticas oligárquicas que tornam inconsistente a redução das desigualdades e a consolidação democrática.

Texto:

Quando se aproxima mais uma comemoração do 25 de Abril - a Revolução dos Cravos (1974) -, repete-se com apreensão a interrogação que mais interessa: iniciámos um círculo virtuoso ou não saímos do vicioso?

A história relata-nos que as nações que desenvolveram políticas e organizações inclusivas entraram em círculos virtuosos. Em regra, tudo começou com uma revolução. Foi assim com a Gloriosa de Inglaterra (1688) e com a Francesa (1789). A história reserva-lhes uma influência democrática marcante. Criaram-se instituições inclusivas, mas foi necessário tempo, e muita determinação, para que a "lei de ferro das oligarquias" não se impusesse aos novos poderes e perpetuasse círculos viciosos.

E o 25 de Abril também constará da história universal das revoluções, embora ainda não se identifique com clareza se os ideais democráticos soçobraram. Só o distanciamento histórico clarificará a consistência da transformação das políticas e organizações extractivas em inclusivas. Mas se as oligarquias se impuseram na escravatura, no ouro, nas especiarias e no colonialismo, também a recente crise do sistema bancário associada a organizações marginais, e numa época de abundantes fundos europeus, acentua uma tendência que preocupa até os mais optimistas. A persistente erupção de intermináveis casos, e de megaprocessos judiciais, faz temer a prevalência de práticas oligárquicas que tornam inconsistente a redução das desigualdades e a consolidação democrática. Aliás, os sistemas de justiça e de educação desempenham papéis fulcrais nestes domínios e têm sido alvo de desinvestimentos ou de políticas extractivas.

E se a escola é um espelho da sociedade, há motivos inquestionáveis para apreensão. Apesar da escolarização da sociedade ter aumentado em consequência da conferível melhoria do nível de vida que exige ciclos afirmativos de duas décadas, o que levamos de milénio tem indicadores não inclusivos: uma rede escolar segregacionista (e encerramento de 9000 escolas - sobraram cerca de 5000 - em grande parte no interior do país ou fora dos grandes centros) e a falta estrutural grave de professores. Aliás, o actual primeiro-ministro confessou, em 2015 à SICN, que, num Conselho de Ministros de 2006, foi declarada uma "guerra aos professores da escola pública" através de um tríptico de instrumentos: degradação da carreira, avaliação kafkiana e modelo autocrático de gestão das escolas. Como se comprova, havia áreas despesistas, corruptas e de branqueamento de capitais onde desenvolver os instintos ferozes e belicistas. Mas esse Governo impôs a delapidação à escola pública com o apoio de todas as forças partidárias do denominado arco governativo. Para além disso, e para fundamentar os receios de não termos entrado num círculo virtuoso, o Governo de Passos Coelho agravou o tríptico e os de António Costa mantiveram-no com o respectivo suporte parlamentar.

Mas o que mais se salienta na ideia de insustentabilidade virtuosa é a reconhecida depauperação financeira. Enquanto se delapidavam pilares da democracia, os predadores executavam uma autêntica fita de gangsters que foi das operações furacão, monte branco e marquês até ao "infindável" desfile bancário e passando pelas mais diversas figuras com cargos governativos ou associados que se percebeu integradas neste ambiente extractivo. E nem é atributo essencial para o juízo da evolução democrática que a justiça, e o seu código penal, nos surpreenda com tanta prescrição ou ineficácia. Sabemos das dificuldades em investigar a corrupção e da evolução do direito. Mas também intuímos que não se inicia um círculo virtuoso sem uma justiça eficaz, válida e operante. Mas sejamos objectivos: o que se evidencia do rol de processos é suficiente para se temer pela prevalência da "lei de ferro das oligarquias".

 

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