"Escolas preparam alunos para um mundo que já não existe"
Desta vez, a "nova" veio pela voz de Rod Allen: "Escolas preparam alunos para um mundo que já não existe. Se queremos saber alguma coisa temos os telemóveis que sabem muito mais do que nós. Já não faz sentido a escola que debita informação memorizada até ao dia do exame e rapidamente esquecida para decorar outra matéria. O foco transferiu-se do “saber” para o “perceber”." O canadiano tem, desde logo, um mérito: se a 4ª industria transporta um universo de incertezas, a começar pela escola, o mundo só pode pôr os olhos nas suas certezas. A começar pelos gurus tecnológicos de Silicon Valley que desesperam, mas com conhecimento, por desconectar das tecnologias as crianças e jovens até aos 13, 14 anos. Querem que leiam em papel e que substituam o tempo tecnológico por brincadeiras que desenvolvam competências sociais, corporais e ambientais.
Sem ironia: se o contraditório é uma exigência, a corrente do canadiano contribui. E isso é relevante. Não ajuda "amar ou odiar" o que defende. Importa discutir, sem ignorar que os retrocessos civilizacionais, ou os imobilismos, levam anos a recuperar. Aliás, Portugal é um espelho desse fenómeno. A escola, que é, quase por definição, uma instituição em crise, foi exposta à desorientação que tomou conta da sociedade com a importação sucessiva de modelos.
Centremos o debate: coração do currículo, interdisciplinaridade (um desejo antigo anterior às novas tecnologias), sucesso escolar, avaliação contínua e inclusão, são, há muito, os atributos democráticos. Estabelecem o denominador comum. Não faz sentido, por exemplo, contrapor o "ler, escrever e contar" ao imperativo moderno dos saberes estruturantes das ciências, humanidades, línguas, artes ou desportos. Se se oscila nos extremos, abre-se espaço à desorientação e ao tribalismo. As sociedades só "sobrevivem" com sistemas modernos e sensatos. Antecipam-se se sintetizarem a incomunicabilidade das ciências da educação com as da gestão e administração, se não desprezarem o que disse William Golding, Nobel da literatura (1983) e professor no 1º ciclo durante 30 anos: "com 30 alunos não há método de ensino que resulte, mas com 10 alunos todos os métodos podem ser eficazes", e se não devassarem a organização escolar nem as carreiras. Pelo contrário, têm que lhes testemunhar confiança e uma atmosfera desburocratizada, sensata e, obviamente, mobilizadora para o essencial: a sala de aula e as suas condições de realização (a finalidade da organização escolar). Portugal fez o oposto. A hiperburocracia e a desconfiança na escola e nos professores foram causa e consequência da desorientação das políticas educativas e da sucessiva regulamentação de opostos. A última década e meia foi tão instável que está, de novo, quase tudo por fazer. Não haverá, isso com toda a segurança, mundo para tanta exclusão. Mais ainda, e como disse Niklas Luhman - (2001:14) "A improbabilidade da comunicação" -, quando o homem perdeu "a posição de centralidade no organismo social e foi remetido para o exterior, passando a fazer parte do meio ambiente do sistema. Tornou-se uma causa para o aparecimento de problemas constantes e de complexidades crescentes" .
Imagem: desenho de Quino.