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Correntes

da pedagogia e em busca do pensamento livre

Correntes

da pedagogia e em busca do pensamento livre

Da Trágica Falta de Professores

08.02.20, Paulo Prudêncio

Captura de ecrã 2020-02-08, às 15.12.41.png

 

Destaca o Expresso: "Envelhecimento ameaça deixar escolas sem docentes". Há cerca de uma década que se percebeu que isto ia acontecer, mas os avisadores foram rotulados de alarmistas. Pois bem: o grave problema passou de conjuntural (mais de metade dos professores, 52.000 são cerca de 60% dos que existem, reformar-se-á até 2030) a estrutural. A notícia também destaca o silêncio do Ministério da Educação. Aliás, é um antigo e ensurdecedor silêncio em relação ao essencial. Fala-se de escola do século XXI, de autonomia, de flexibilidade curricular e de inclusão, mas o que é ainda mais estruturante, e com efeitos muito negativos, mantém-se imutável há mais de uma década. Fala-se do que dá algum lustro mediático e silencia-se o que é mais exigente. Dá ideia que há um misto de "nem queremos ouvir falar nisso" com "é melhor fazermos de conta que está bem assim". Será mais grave se subsistir o "está bem assim" misturado com o "não faço qualquer ideia" e com a obsessão de que esta municipalização é uma panaceia progressista.

Mas outra causa que transformou em estrutural a falta de professores ficou patente na aprovação do OE2020. O discurso de Mário Centeno incluiu um elenco de elogios a Portugal: somos dos melhores da Europa a lidar com a dívida pública, nas condições para o investimento, para viver, para fazer turismo e por aí fora, e na educação (citou o PISA). E quando repetiu que os alunos, e só os alunos, estavam de parabéns, a sua bancada irrompeu em aplausos como não fizera a nenhum dos elogios anteriores. Se achou oportuno um elogio (mesmo que exagerado), seria, no mínimo, à escola pública que é quem acolhe todos os alunos e ajuda a melhorar indicadores de resultados e abandono escolar. A omissão dos professores foi particularmente saudada pela bancada do PS. Percebeu-se. É grave este estado da relação dos partidos de Governo com os professores do seu país que foram objecto de uma série de medidas inquestionavelmente neoliberais e que mantém injustiças brutais.

Há dois anos - e para não recuar a 2008, em "Escolas sem Oxigénio", quando tudo começou ou ao tempo da troika -, escrevi assim:

"A OCDE concluiu que há professores na Europa a precisar de tutorias e há quem pense de imediato em Portugal e no regresso dos professores titulares. Não é assim. Há países "sem" professores, tal os tratos a que o grupo profissional tem sido alvo. No Reino Unido e na Alemanha (citada por Centeno no discurso do OE2020 por estar atrás de nós no PISA), por exemplo, precisam de tutorias porque há pessoas sem formação académica, e muito menos profissional, que recorrem ao ensino "apenas" por um salário. Em Portugal, como em França ou Espanha, ainda não é tanto assim. Mas não tarda. Por cá, lá abrirão os telejornais com a falta de professores porque o estatuto da carreira se degradou. Quase que não existem alunos no não superior candidatos aos cursos de formação de professores e os excessos no tempo para a aposentação provocam baixas médicas em catadupa e uma atmosfera de substituições temporárias pouco apelativa".

Chegados aqui, e como nada se fez na formação inicial e se agravaram as condições de realização do ensino e da carreira dos professores, só nos restaria implorar que os robots atenuassem a falta estrutural de professores. Mas os estudos sensatos em IA remetem a profissão de professor para as insubstituíveis porque os robots do futuro próximo só estarão emocionalmente aptos para liderar os seus semelhantes e em grupos com 1 aluno. Portanto, é avisado antecipar (mesmo que nos rotulem de novo como alarmistas) que nem os robots impedirão a estrutural, e trágica, falta de professores.

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