um dia
Cortesia de Manuela Silveira.
Um dia,
os intelectuais
apolíticos
do meu país
serão interrogados
pelo homem simples do nosso povo.
Serão perguntados
sobre o que fizeram
quando a pátria se apagava lentamente,
como uma fogueira frágil,
pequena e só.
Não serão interrogados
sobre os seus trajes,
nem acerca das suas longas
sestas após o almoço,
tão pouco sobre os seus estéreis
combates com o nada,
nem sobre sua ontológica
maneira de chegar às moedas.
Ninguém os interrogará
acerca da mitologia grega,
nem sobre o asco
que sentiram de si,
quando alguém, no seu fundo,
dispunha-se a morrer covardemente.
Ninguém lhes perguntará
sobre suas justificações absurdas,
crescidas à sombra
de uma mentira rotunda.
Nesse dia virão
os homens simples.
Os que nunca couberam
nos livros e versos
dos intelectuais apolíticos,
mas que vinham todos os dias
trazer-lhes o leite e o pão,
os ovos e as tortilhas,
os que costuravam a roupa,
os que manejavam os carros,
cuidavam dos seus cães e jardins,
e para eles trabalhavam,
e perguntarão,
“Que fizestes quando os pobres
sofriam e neles se queimava,
gravemente, a ternura e a vida?”
Intelectuais apolíticos
do meu doce país,
nada podereis responder.
Um abutre de silêncio vos devorará
as entranhas.
Vos roerá a alma
vossa própria miséria.
E calareis,
envergonhados de vós próprios.
Otto Rene Castillo