Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Correntes

da pedagogia e em busca do pensamento livre

Correntes

da pedagogia e em busca do pensamento livre

Impressiona Como Pouco Se Aprendeu Com A Pandemia

30.11.21, Paulo Prudêncio

A escola como guardadora dos alunos continuará a ser a sua principal função na totalidade do país, como se uma área metropolitana fosse igual a um concelho do interior. E nem a primeira semana de aulas no início de 2022 escapa: não há ensino à distância porque guardar é a única via e eliminam-se dias de oxigenação nas pausas essenciais.

Tanta "Uber-Escola" que já não há professores

26.11.21, Paulo Prudêncio

Captura de ecrã 2021-11-26, às 14.07.19.png

 

Tanta "Uber-Escola" que já não há professores

Pelo Público em 26 de Novembro de 2021. Como acordado, o texto está publicado no blogue.

Título:

Tanta "Uber-Escola" que já não há professores

Lide (lead): 

É crucial sublinhar as causas das políticas mais ideológicas que foram extremadas por cá, com graves prejuízos também para alunos e restantes profissionais da educação.

Texto

A crescente falta de professores é indisfarçável. Tem causas há muito identificadas e importa enquadrar a fuga a ser professor que atinge vários países da Europa; até a exemplar Finlândia, após as "reformas" do Governo (de 2015 a 2019) do "milionário das telecomunicações" Juha Sipilä

Começar do zero e reescrever as regras do jogo é a conclusão de Shoshana Zuboff (2020), em "A era do capitalismo da vigilância", no que é acompanhada por muitos investigadores e investidores. E aponta os resultados mais críticos das políticas económicas das últimas cinco décadas que também influenciaram os sistemas educativos: polarização política, alterações climáticas, monopólios que eliminam a concorrência, mercados desregulados, primado absoluto do capital sobre o estado-providência e custos incalculáveis na coesão social e no bem comum. 

Contudo, os menos cépticos já percepcionam um momento de inflexão que exige duas possibilidades vitais: armazenamento de energia e organizações da democracia com modelos que não dependam tanto da personalidade de quem as gere.

E se os efeitos do jogo vigente variaram nos países ocidentais, com as democracias do norte da Europa a atenuarem as consequências, já as políticas de desregulação e precarização (que Thatcher e Reagan iniciaram e Clinton, Blair, e Schröder continuaram) anteciparam a revolução na organização do trabalho: para se sobreviver, pode ser-se motorista da Uber, comprador da Glovo e anfitrião do Airbnb.

Em Portugal, a falta estrutural de professores - a mais grave dos 27 países da UE - deveu-se à construção paulatina da escola pública mais "Uber" da Europa que só se "salvaria" numa hipotética, e cada vez mais longínqua, transição do modelo actual para organizações digitais sem turmas nem disciplinas.

E é crucial sublinhar as causas das políticas mais ideológicas que foram extremadas por cá, com graves prejuízos também para alunos e restantes profissionais da educação:

1. Degradação do estatuto da carreira e do sistema remuneratório. Como a Comissão Europeia voltou a reconhecer no mês passado, a precarização dos professores não tem paralelo nas leis do trabalho na Europa (no público nem no privado) com profissionais a contrato durante décadas. Para além disso, o exercício de todos os professores passou a incluir horários ao minuto com mais turmas - e turmas com mais alunos - e um conjunto de procedimentos, repetidos e inúteis, que efectivou a perda de atractividade da profissão;

2. Avaliação de professores, com quotas e vagas, inspirada em modelos individualistas e dilacerantes das atmosferas relacionais que sofreram o primeiro e sério revés nos 35 suicídios do conhecido processo da France Telecom na primeira década do milénio. É fundamental corrigir um sistema que é uma caixa de pandora para as variantes de assédio no ambiente profissional e recuperar a humanista avaliação olhos nos olhos;

3. Escola a tempo inteiro que se transformou em educação a tempo inteiro na escola. Como a OCDE  reconheceu no mês passado, só em Portugal o sistema não se centra nas aprendizagens e foi imposto de forma impensada com o mesmo programa na totalidade do país associado à precarização dos professores como guardadores no modelo "Uber";

4. Modelo autocrático de gestão norteado por interesses divergentes da missão da escola pública, combinado com um modo de agrupar escolas único na Europa que fez terraplanagem da história das organizações e dos mecanismos de cooperação e secundarizou a decisiva gestão de proximidade;

5. Ranking de escolas sempre "em progressão" dado a ausência de dados fundamentais, e, desse modo, eficiente na propaganda comercial com graves prejuízos para a igualdade de oportunidades e para o exercício dos professores.

Posto isto, evidencie-se a incapacidade política dos sucessivos governos na democratização destes instrumentos. A mistura de fuga ao real com inaptidão resultou numa inércia que tornou irrelevante o papel da escola nos debates orçamentais e eleitorais. 

A recente aversão dos professores, bem documentada nos espaços de opinião, à Escola Ubuntu (mas podia ser outro projecto e também bem intencionado), é uma reacção cansada e irritada ao efeito mediático de distracção que a inflação de projectos provoca em relação às questões fundamentais. E depois, há uma espécie de entretenimento infernal promovido por personalidades que gravitam na galáxia dos governantes e numa órbita distante das salas de aula.

Em suma, a inundação de projectos (exactamente o que mais originou a crise finlandesa) provoca climas de adesão militante ou de revolta contida: escolas que querem agradar ao poder que as avalia e professores avaliados sobrecarregados com as burocracias mil vezes identificadas e outras tantas invisíveis para governantes.

Por outras palavras: "Uber-Escola" para as salas de aula e Escola Ubuntu para o espaço sideral, anunciado com pompa na tradição que nos consome: Urbi et Orbi(ta); encomende-se mais um "Ubuntu-estudo" e crie-se uma "Ubuntu-task-force".

"Também Se Trabalha Para Ganhar Dinheiro" - Mário Silva

25.11.21, Paulo Prudêncio

Texto recebido por email devidamente identificado:

"Têm aparecido vários artigos de opinião nos jornais sobre a falta de professores com um denominador comum: que não é o dinheiro que move o exercício profissional. Este estigma criado na comunidade, em que quem trabalha para ganhar dinheiro é mal visto, é uma falácia tremenda porque trabalha-se exatamente para ganhar dinheiro, sem o qual não é possível viver na sociedade moderna. Essa ideia de que o dinheiro é o menos importante, trabalhando-se por 'meia dúzia de patacos' desde que se seja feliz, é  uma fantasia romântica que facilmente se desmorona quando a pessoa começa a receber as contas para pagar. Embora o dinheiro possa não ser uma obsessão profissional, é um motivo muito importante; portanto, quando se sabe que milhares de docentes na faixa etária dos 50 anos, estão emperrados no meio da carreira remuneratória, ganhando centenas de euros mensais a menos do que deveriam para o tempo de serviço que têm, e sabendo que jamais atingirão o topo da carreira em tempo de vida útil de trabalho, isto é um facto que desincentiva os profissionais atuais e os futuros candidatos, sabendo estes os custos enormes que têm de suportar na sua vida (habitação, mobilidade, etc.).

Por isso, não há que ter pudor em afirmar que o valor do salário é um fator importante para se decidir pelo exercício de uma profissão, sabendo também que esse valor influenciará a qualidade de vida na velhice.
 
Mário Silva"

Até na Finlândia

21.11.21, Paulo Prudêncio

Inércia e Engenharia Social São as Causas da Histórica Falta de Professores

19.11.21, Paulo Prudêncio

"Inércia e engenharia social são as causas da histórica falta de professores"

Captura de ecrã 2020-10-22, às 09.27.18.png

Texto de 22 de Outubro de 2020:

Inércia dos sucessivos governos e crença na engenharia social, são as causas da histórica falta de professores. Como ponto prévio, recorde-se que o primeiro-ministro condenou (SIC, 18.04.2015) a "guerra aos professores da escola pública decidida num conselho de ministros de 2006" que originou a célebre manifestação de 2008 e que Passos Coelho legislou horários ao minuto para reforçar a precarização enquanto Nuno Crato declarava que "há professores a mais" (Jornal I, 21.03.2013). São dois exemplos que retratam a engenharia social que oxigenou as finanças e que fatalmente promoveu a inércia. Mas já lá vamos.

A grave falta de professores tornou-se estrutural. Mesmo que se iniciasse uma urgência formativa, os efeitos surgiriam depois de 2030. O agravamento será progressivo. Mais de metade dos professores reformar-se-á nesta década. Vários cursos de formação inicial estão há anos a fio sem alunos. Em cada mil alunos do secundário, contam-se pelos dedos de uma mão os que escolhem o ensino.

Há causas identificadas: a burocracia do exercício que tratarei no fim deste texto; a devassa mediática da profissão que lhe retirou atractividade; a degradação da carreira e da democracia nas escolas; e o esgotamento do modelo de formação inicial. Neste último domínio, uma solução mais apelativa e flexível passaria por licenciaturas eclécticas dentro das grandes áreas. Nos mestrados, estudar-se-ia a pedagogia e o aprofundamento científico. Depois de um estágio plurianual em exercício, aceder-se-ia ao quadro. Mas nada disso se discute. Instalou-se a inércia. Quem vier a seguir que resolva a equação.

Para além disso, os governos esperam recrutar licenciados desempregados. Chamam-lhe outras ferramentas. Mas é muito incerto. Não se sabe onde é que haverá desemprego e não existirá procura nas humanidades e nas artes.

Também não é seguro esperar que a inteligência artificial substitua os professores. E cresce a apreensão ao olharmos para a tendência global da engenharia social: as gigantes tecnológicas de serviços - google, amazon, uber, booking ou airbnb - não produzem conteúdos para os motores de pesquisa, nem carros, hotéis, imóveis de aluguer ou objectos, mas facturam pela sua compra ou utilização com trabalhadores precários instalados na nuvem; há uma revolução do trabalho que pede como competência a ligação à internet e, como escreve Klaus Schwab (2017:46), na "A Quarta Revolução Industrial", "parte da força de trabalho desenvolve diferentes tarefas para assegurar o seu rendimento - pode-se ser um motorista da Uber, um shopper do Instacart, um anfitrião do Airbnb e um Taskrabbit". Nesta lógica, desejam-se os monitores que assegurem a ordem na escola presencial automatizada enquanto os encarregados de educação trabalham. Acima de tudo, prestarão um "relevante" serviço aos orçamentos dos países.

Diz-se que são as regras do jogo. No entanto, é importante que se evidencie que os professores continuam na zona de incerteza das profissões mais e menos propensas à automatização. E como inscrevem os investigadores da quarta indústria, o futuro será muito bom ou caótico não dependendo da vontade divina. Aliás, a corrida ao trabalho virtual não regulamentado poderá transformar-se em forte instabilidade social e política difícil de reverter sem formação de professores.

A crise Covid-19 radiografou o fenómeno. Foi surpreendente o anúncio do reforço de contratação e já é o próprio anunciante, "o Ministério da Educação, que admite que a substituição de professores está a ser difícil". É esta irrealidade que espelha o inferno burocrático que referi anteriormente. Mas é também por inércia. Percebe-se ainda melhor se olharmos para uma vertente decisiva: o digital escolar.

Repare-se que Portugal evidencia o que falta fazer no universo escolar. É estranho que assim seja porque temos provas dadas onde a sociedade em rede permite desempenhos organizacionais ímpares: rede multibanco, via verde ou critical software. Por exemplo, quando o ministro da educação diz que - "é impossível saber quais os alunos que não têm internet e computador" - estão mais de duas décadas em que essas perguntas são feitas no início de cada ano lectivo e perdidas na incapacidade de se gerar um sistema de dados que se aproxime sequer dos três citados. E, ciclicamente, os serviços centrais promovem formação em competências digitais para todos como uma espécie de panaceia que se revela irrelevante. É um desfasamento que acrescenta entropia e não impede a exibição do supérfluo, mas inibe o substancial e gera desperdícios financeiros. Dá menos trabalho do que o essencial e o organizacional. É um desequilíbrio avassalador das aprendizagens essenciais. Infelizmente, as sucessivas políticas convenceram-se que a formação e a carreira dos professores não são bens preciosos para os bons desempenhos organizacionais no futuro nem para a consolidação da democracia.

Da Deprimente Task Force para a Terceira Divisão

18.11.21, Paulo Prudêncio

A educação é a terceira divisão da organização dos governos. Maria de Lurdes Rodrigues, "que trocou os professores pelos eleitores", começou os cortes a eito e Nuno Crato, o estatístico, agudizou-os. Sucedeu-lhes um enigma que deve ser de grande utilidade como adjunto do secretário de estado das finanças. Há várias declarações para a história. Repare-se na imagem de 2012.

986823FD-F45B-4F9B-B5EF-A088759FB84C.jpeg

 

 

Da Falta de Professores

17.11.21, Paulo Prudêncio

Esta publicação é de 27 de Setembro de 2017 e podia ir muito mais atrás.

Ficaram professores por colocar? Sim; em poucos grupos de recrutamento (uma modernice vocabular recente e evitável) é um facto. Mas uma passagem pelas listas dos professores não colocados ou de reservas de recrutamento, regista um número reduzido (ou ausência) de candidatos para várias disciplinas. É uma tendência que se agrava e que abrirá telejornais. Com a "eterna" precarização dos professores contratados (há quase duas décadas nos vínculos e salários) associada ao estatuto de cobaia na avaliação kafkiana (e de moeda de troca entre governos e sindicatos) e passando por um processo de desconsideração profissional, é natural que os jovens desistam de "ser professor" e que os menos jovens optem por outra actividade no país ou no estrangeiro.

 

PS: se nada se fizer no estatuto dos professores do quadro, as condições de aposentação associadas ao burnout provocarão uma avalanche de insubstituíveis. Aliás, basta que o inverno se imponha.

 

image

 

Imagem obtida na internet

sem referência ao autor

Pág. 1/3