"a vida real pessoal e pedagógica não é uma declaração jornalística..."
23.02.18, Paulo Prudêncio
Contributo de Mário Silva.
"A vida real pessoal e pedagógica não é uma declaração jornalística...Uma professora ficou sem voz e este facto permitiu refletir sobre 3 condições:1- uma ferramenta profissional essencial;2- a manutenção de uma crueldade social;3- a falácia da flexibilidade curricular.
1- Um docente sem voz não pode ensinar. Pode não ter membros, estar paraplégico ou até tetraplégico, que tendo voz, pode ensinar. O som é uma ferramenta essencial no ensino.2- O docente não tem voz mas mantém-se funcional em todos os outros aspetos; contudo, como não tem a ferramenta essencial, tem de declarar incapacidade temporária, para recuperar algo que demora aproximadamente 5 dias a ficar normal. No modelo social atual, implicaria apresentar atestado médico, sendo descontado integralmente 3 dias de salário e uma percentagem nos restantes, agravando o já degradado rendimento mensal.
3- Para não perder um rendimento não desprezável, foi pedida uma coadjuvação voluntária. Na aula de uma turma do secundário, a coadjuvante servia de porta-voz, orientando a aprendizagem de acordo com o modelo de flexibilidade curricular que se quer generalizar. Neste modelo, o conceito de aprendizagem significativa é o cerne do processo; mas implica uma disponibilidade tanto dos alunos como de tempo letivo. O plano de aula desenvolveu-se de modo a que começou a mobilizar aprendizagens de outras áreas do conhecimento; apesar da produtividade, em determinado momento a colega sussurrou ao ouvido da coadjuvante: ”Já estou atrasada no programa relativamente ao outro colega que tem outra turma. Temos de abreviar”. E nesse momento, constata-se a falácia da flexibilidade curricular quando se tem a grilheta do programa obrigatório do exame nacional para cumprir, algo essencial ao destino dos alunos mas irrelevante para a aprendizagem significativa...Essa falácia torna-se mais evidente quando os futuros alunos universitários constatarem que nesse modelo de ensino impera o expositivismo 'puro e duro', tendo de se desenrascarem sozinhos, sem terem acesso a serviços de apoio educativo, ocorrendo inevitavelmente um choque intelectual negativo."E assim, as declarações dos pretensos modificadores de métodos de trabalho pedagógico em conferências de imprensa, artigos de opinião ou vídeos de divulgação, revelam-se desfasadas do que acontece no quotidiano real...Mário Silva