Foi daqui.
Um dos meus blogues de leitura obrigatória, aqui, proporciona interessantes debates a que por vezes não consigo escapar. Por muito que já tenha escrito sobre um assunto, não resisto a dar a minha opinião. Foi o caso no post que pode ler aqui e que me exigiu um comentário demasiado extenso e que entrou por partes. Publico-o também no "correntes" e de seguida.
Viva caro João.
O comentário da Isabel X suscita um conjunto muito importante de reflexões que têm ocupado grande parte da minha produção escrita dos últimos anos, através da publicação de textos no meu blogue e afins. Sinto, por isso, um natural estado de redundância. Mas como o governo é o mesmo, e as políticas também, só nos resta insistir.
Concordo com grande parte da argumentação da Isabel X, nomeadamente com a importância que ela atribui ao ensino e à sala de aula. É mesmo a partir daí que tenho sustentado toda a argumentação em defesa da escola pública, do seu poder democrático e do compromisso com o ensino e com as salas de aula, salientando a necessidade de se derrubar o muro (outro muro e vinte anos depois) de burocracia que asfixia as escolas e a possibilidade do ensino. Não é fácil, bem pelo contrário. Trata-se de derrubar uma indústria que move milhões e que é tentacular. Mas, a exemplo do de Berlim, quem não desistiu e continuou a lutar assistiu ao desmoronar de uma barreira que "era "apenas" uma linha traçada no solo".
Nada do que aconteceu nos últimos quatro anos é definitivo; e o que é injusto merece sempre cair. Seja o concurso de titulares – é certo que será difícil ressarcir os professores que fugiram da “loucura” com penalização e isso dói -, com os seus aberrantes critérios, seja o inaplicável modelo de avaliação ou mesmo o modelo de gestão.
Embora estes três diplomas se articulem, centremos a discussão no modelo de gestão e nas varáveis mais polémicas e que podem ser corrigidas.
Nunca defendi a existência de assembleias (agora conselhos gerais e antes conselhos de escola) compostas apenas por professores. Nunca foi assim e concordo com esse princípio. Do que discordo é da trapalhada para escolher o director: um concurso que acaba em eleição para encaixar na desrespeitada lei de bases. O caderno eleitoral é muito reduzido e faz recordar o iraniano "conselho de guardiães". Pode ser alterado. Também não concordo com os requisitos para se ser director que são os mesmos que existiam para se ser presidente de Conselho Executivo: o ter-se um mandato ou mesmo uma qualquer formação na área nada garante: sabemos que as melhores lideranças escolares resultaram de professores comprometidos com o ensino e com as salas de aula; e isso só uma comunidade reconhece. Pode ser alterado.
Mais: o actual modelo de avaliação requer titulares para avaliadores: ora o director como avaliador-mor pode não o ser para agradar a muita clientela: trapalhada que até pode ficar como está se caírem os titulares.
Por falar em avaliador-mor, importa referir o seguinte: o modelo de gestão tem um processo de que discordo de selecção do director, e tem, para este, um conjunto de funções inenarráveis e inaplicáveis. Sabe-se que avaliação de professores é composta por duas componentes: a científico-pedagógica, avaliada pelo coordenador, e a funcional, avaliada pelo director; também se sabe que o modelo prevê avaliar os professores todos nos anos todos. Ora, na componente funcional inscrevem-se autênticos atentados ao bom senso: dois exemplos: compete ao director pontuar e seriar, com quotas e tudo, todos os professores na dimensão ética (pontuar a dimensão ética e cívica de um grupo de indivíduos ?!!!) e na participação em reuniões. É muito grave. Pode ser alterado.
Mais: o director nomeia todas as lideranças intermédias que eram, até aqui, eleitas pelos seus pares. É muito grave também. Sabe-se que este modelo de gestão se inspirou num conjunto de teses que ruíram e que negavam valor ao exercício cooperativo: defendiam que unipessoal era sinónimo de eficácia e de eficiência e que o colegial gerava desperdício e lideranças fracas. Um erro, como se sabe. Sabemos que mais do que os modelos contam as pessoas e há as que lideram bem em qualquer modelo. Mas também se percebe que neste os tiranetes têm mais caminho aberto para o seu despautério. Afinal, foi em democracia que as sociedades mais se desenvolveram. Podemos perguntar assim: quem tem medo da democracia? Ou mesmo: quem tem vergonha da democracia?
Nunca nos devemos esquecer: a ministra da Educação responsável por estas politicas defendeu publicamente que o poder democrático das escolas era dispendioso em termos financeiros e que a lógica subjacente às suas politicas previa uma hierarquia férrea na administração do sistema escolar onde as escolas se integravam numa lógica de repartição pública e em que os directores seriam uns burocratas investidos de poderes de chefe de serviços e de repartição.
Isto já vai longo e não vos quero maçar mais.
Isabel X: esta luta é antiga e longa e vivemos apenas mais um episódio; é certo que custa sentir que assistimos nos últimos 4 anos ao maior ataque ao poder democrático da escola e ainda por cima perpetrado pelo partido socialista.
Abraço.