em busca da identidade - o desnorte
Estou a ler o último livro de José Gil, "Em busca da identidade - o desnorte" e recebi um resumo que aconselho. A tarefa foi realizada pela professora de filosofia Manuela Silveira.
Ora leia.
"“No processo de domesticação da sociedade, a teimosia do primeiro-ministro e da sua ministra da Educação representam muito mais do que simples traços psicológicos. São técnicas terríveis de dominação, de castração e de esmagamento e de fabricação de subjectividades obedientes.”
“Verifica-se no Ministério da Educação um fenómeno constante, emblemático da política deste governo: tomam-se medidas chico-espertas integrando o chico-espertismo no quadro da lei, institucionalizando-o (…). É o sistema inteiro que se converte ao chico-espertismo.”
“Tal como a Polizeiwissenschaft alemã do século XVIII, o governo é levado a invadir, explorar e regulamentar domínios, comportamentos e funções que escapavam ao Estado, introduzindo-se mesmo na vida privada do cidadão. Na esfera da Educação, por exemplo, o tempo de trabalho do professor é preenchido ao máximo – desde as 35 horas obrigatórias de presença na escola ao encurtamento brutal do tempo de férias, aliás, “pausas lectivas”, expressão nova, como para mostrar que a vocação do professor deve envolver não só o tempo de trabalho, mas a sua vida inteira. O trabalho do professor deve integrar e devorar o tempo da vida privada e do lazer. Viver para si ou para a família, só numa “pausa lectiva”…”
“…a dupla vertente da governação Sócrates (…) - por um lado, centralismo autoritário, regulador (…); por outro, a vontade de “emagrecer o Estado”, reduzindo o seu peso na sociedade civil (…), leva a que os efeitos das reformas, e em particular a do sistema educativo, possam ser, na substância, puramente superficiais, não produzindo mudanças de fundo, e, na forma, imperativos pesadíssimos, tarefas insuportáveis e inexequíveis. Porquê? Porque – e refiro-me ao Estatuto da Carreira Docente, ao Estatuto do Aluno e à avaliação dos professores – a vertente autoritária e super-reguladora do Estado exerce-se fundamentalmente e quase exclusivamente na forma, na burocracia, nas centenas de documentos, formulários, regulamentações que os professores devem estudar, preencher, horários extraordinários que devem cumprir, etc., sem que os conteúdos do ensino, a substancia da relação de aprendizagem professor-aluno seja tratada.
Quem examine em pormenor toda esta extraordinária burocracia, que já é pós-kafkiana, a que estão submetidos os professores, fica com a ideia de que uma espécie de delírio atravessa quotidianamente os conceptores e decisores do MNE.
“Uma primeira característica da retórica de José Sócrates: quando inaugura uma escola, um tribunal, quando celebra as virtudes de uma iniciativa do Governo ou premeia os resultados de tal grupo da sociedade civil, uma ideia surge sempre, reiterada até à exaustão – a ideia de que aquela «é a obra necessária, que vem na hora certa para a modernização do país»; era daquilo «que nós precisávamos», e de que vamos precisar»; e que toda a acção do Governo «vai naquele sentido, porque é o sentido certo, e devemos insistir cada vez mais em acções e iniciativas daquela natureza». (…)
Talvez seja esta uma das grandes originalidades de um discurso que, por outro lado, repete sempre as mesmas ideias, quase com as mesmas frases, literariamente medíocre, lexicamente pobre, sem rasgos nem surpresas: é que está constantemente no presente mítico, transformando a obra mais banal num acontecimento de relevância única, exemplar, modelar."