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Correntes

da pedagogia e em busca do pensamento livre

Correntes

da pedagogia e em busca do pensamento livre

a luta segue dentro de momentos (3)

14.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

Na sequência da reunião de membros dos Conselhos Executivos das Escolas realizada em Santarém, no dia 10 de Janeiro de 2009, recebi a seguinte informação:

 

 

Colegas:
Os 14 Presidentes dos Conselhos Executivos de Agrupamentos de Escolas e de Escolas não agrupadas que, mandatados pelos presentes na reunião de 10 de Janeiro, em Santarém, pediram audiência à Srª Ministra da Educação, foram informados pelo gabinete da Srª Ministra que a mesma os receberá, amanhã, dia 15 de Janeiro às 13H30.
Depois de entregarmos o Manifesto à Srª Ministra, enviaremos para vós o teor do mesmo.
Pel’a Organização,
Rosário Gama

medo e esperança

13.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

 

 

 

 

 

Olhando para as posições dos professores que antes estavam nas manifestações e que agora demoram a acordar, encontrei como epígrafe a um texto de Sandra Monteiro, aqui, que tem como título "O medo e a esperança", o seguinte:

 

«Não coleccionamos transições – caminhadas entre um sítio e outro.

Tal incapacidade, pois disso se trata, é, entre várias,

uma das que mais nos menoriza.» 

 

Gonçalo M. Tavares, 

Breves Notas Sobre o Medo,

Relógio D’Água, Lisboa, 2007, p. 15.

 

política e impedimentos

13.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

 

 

 

 

Não tenho o hábito de publicar frases históricas. Mas a que se segue deixa-me com um leve sorriso e não resisti.

 

Ora leia:

 

«A política é a arte de impedir as pessoas

de se meterem naquilo que lhes diz respeito.»

 

 

Paul Valéry in Le Monde diplomatique, aqui.

 


 

esclarecimentos

12.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

A Fenprof publicou um conjunto de importantes esclarecimentos sobre a avaliação do desempenho.

 

São aquelas questões formais que ajudam a dissipar dúvidas e a espantar medos vários. O Ramiro Marques, do excelente blogue Profavaliação, fez o trabalho que sublinhei em cinzentos. Publico-o com a sua autorização.

 

Ora leia.

Face à confusão que tem sido criada junto dos professores com a publicação do Decreto Regulamentar 1-A/2009, de 5 de Janeiro, e com as ameaças de exercício de acção disciplinar caso não sejam avaliados, a FENPROF esclarece:
1.Com a saída do Decreto Regulamentar 1-A/2009, de 5 de Janeiro, passou a existir alguma situação nova no que respeita a obrigações ou sanções disciplinares?
R.: Não. Este decreto regulamentar veio substituir, para este ano, o Decreto Regulamentar 2/2008, de 10 de Janeiro, mas apenas no que respeita a procedimentos (mas entretanto saiu a Lei n.º 58/2008 de 9 de Setembro, que no Artigo 17º, diz na alínea “i) Violem os procedimentos da avaliação do desempenho, incluindo a aposição de datas sem correspondência com o momento da prática do acto;”. Isto é só para os Avaliadores ou também para os Avaliados?)A essência do modelo mantém-se inalterável, como confirmam as quotas. Quanto a acção disciplinar não há qualquer novidade deste para o anterior decreto regulamentar (que nunca foi aplicado na totalidade e já foi objecto de outra alteração, pelo que a situação actual nunca se concretizou), como também não se passou de uma situação de vazio legal para outra de existência de quadro legal.
2. Pode ser alvo de acção disciplinar o professor que não entregue os objectivos individuais?
R.: Nada o prevê! O que o próprio ME tem vindo a referir são eventuais sanções (agora, antes disse que quem não entregasse os OI não teriam sanções disciplinares e há DREs que continuam a dizer o mesmo) a quem recuse fazer a sua autoavaliação (qual o normativo que o permite?)Mas a autoavaliação concretiza-se, apenas, no final do ano lectivo com o preenchimento da respectiva ficha. Neste momento, esse não é o procedimento em causa (o que quer dizer que quem não entregar os OI, está sujeito ao preenchimento da Ficha de Auto-avaliação e a ser avaliado!).
3. Qual o fundamento dessa interpretação?
R.: O Decreto Regulamentar 2/2008, de 10 de Janeiro, estabelece como dever do docente, no âmbito do processo de avaliação, a sua autoavaliação (art.º 11.º) que é considerada obrigatória. O artigo 14.º, que define as diversas fases de avaliação, consagra a autoavaliação como a primeira dessas fases. Esse momento tem apenas lugar no final do ano lectivo. Não há qualquer norma de onde se retire, de forma explícita, que a apresentação de objectivos individuais tem carácter obrigatório e que da sua não apresentação se infere uma recusa de ser avaliado(a), logo, não há lugar a qualquer sanção disciplinar(mas tem que se preencher a ficha de Auto-avaliação e ser avaliado!).
4. No caso de, numa escola, continuar suspenso o processo de avaliação, que consequências advirão, para os docentes dos quadros a nível da sua carreira?
R.: A não contagem daquele período de tempo para efeitos de progressão na carreira, embora sem colocar em causa futuras progressões (Artigo 41º do ECD: a) Progressão e acesso na carreira; b) Conversão da nomeação provisória em nomeação definitiva no termo do período probatório; c) Renovação do contrato; d) Atribuição do prémio de desempenho). Obviamente que, por decisão política do Governo e tendo em conta a conturbação existente, mesmo esse efeito, poderá ser anulado.
5. E para os professores contratados?
R.: A consequência imediata prende-se com a renovação de contrato. Porém, esse efeito não se produzirá por, este ano, não haver lugar a renovação de contratos, pois, em 2009, todos os docentes contratados terão de ser opositores ao concurso que se realizará em Fevereiro (e durante o quadriénio, para a renovação dos contratos?).
6. Poderão os Presidentes dos Conselhos Executivos ser alvo de processo disciplinar e/ou demissão do seu cargo por não garantirem, na sua escola/agrupamento, a aplicação do processo de avaliação?
R.: Não! Os membros dos órgãos de gestão foram considerados como dirigentes intermédios de serviço da Administração Pública (artigo 11.º do Decreto Regulamentar n.º 1-A/2009, de 5 de Janeiro). Como tal, caso não garantam a aplicação do processo de avaliação na sua escola poderá ser-lhe atribuída a menção de "Desempenho inadequado", conforme previsto no SIADAP, aprovado na Lei n.º 66-B/ de 28 de Dezembro. Nesse caso, de acordo com o n.º 12 do artigo 39.º, os efeitos são os previstos no artigo 53.º da mesma lei, não se prevendo qualquer sanção disciplinar que, a existir, seria ilegal (excepto se a razão lhe for imputada, caindo no Artigo 38.º do DR 2/08 – “A não aplicação do sistema de avaliação de desempenho do pessoal docente por razões imputáveis aos avaliadores determina a cessação das respectivas funções, sem prejuízo de eventual procedimento disciplinar”, assim como qualquer Avaliador).
7. Deverão os professores entregar, individualmente, algum documento escrito recusando ser avaliados?
R.: Não, porque os professores não recusam ser avaliados, apenas assumem não entregar os objectivos individuais de avaliação nos casos em que o processo não seja suspenso na sua escola (e porque os únicos requerimentos previstos no DR 2/09 e 1-A/09, que exigem assinatura, são: 1. para declarar que querem ser avaliados pelos EE; 2. se querem ser avaliados pelo Coordenador, 3. se querem ser avaliados por outro docente do Grupo e 4. se os que estão em situação ou requeiram a aposentação, querem ser dispensados da avaliação). O mais importante é que, em cada escola, os professores mantenham suspenso o processo de avaliação colectiva que seja subscrito pelos docentes.
8. Como agir no caso de serem exercidas pressões, ameaças, de existirem quaisquer manobras de carácter intimidatório ou, simplesmente situações que levantem dúvidas aos professores?
R.: Contactar imediatamente o respectivo Sindicato que apoiará juridicamente os professores (mesmo que não seja sindicalizado?).
Fonte: FENPROF 

a luta segue dentro de momentos (2)

11.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

 

 

Termina mais um semana alucinante na luta dos professores portugueses.

 

Teve dois episódios curiosos:

 

  • a não aprovação pela assembleia da República de vários decretos que se destinavam à suspensão da avaliação dos professores;
  • e uma primeira reunião de membros dos Conselhos Executivos, estiveram presentes 139 presidentes de Conselho Executivo das escolas e agrupamentos dos ensinos básico e secundário, que decidiu adiar, para data posterior, a possibilidade dos referidos dirigentes se demitirem em bloco (pode encontrar noutra entrada deste blogue o conteúdo completo da moção aprovada).

 

Tenho lido vários textos onde se detecta a natural desilusão com o desfecho destas reuniões. Escreve-se muito sobre a falta de coragem das pessoas presentes e realça-se, com notória e justa indignação, o comportamento dos deputados do partido socialista que exerceram funções docentes até à sua eleição para estas nobres funções.

 

Quer num caso quer noutro, verifica-se a falta de um mesmo princípio democrático que merece a necessária discussão e visibilidade: a ausência de limitação de mandatos no exercício de cargos públicos.

 

Esta limitação só se verifica na mais elevada prática da hierarquia do estado: a presidência da República. É estranho: é mesmo muito estranho que, depois de mais de 30 anos de democracia, tal aconteça.

 

A limitação de mandatos é um princípio crucial ao exercício democrático. Para além do imperativo refrescamento das ideias e das práticas, a rotatividade dificulta a instalação dos favoritismos que minam o processo democrático e que inibem os responsáveis de decidir do modo mais livre que se conheça. Principalmente no último mandato: a curta história do exercício presidencial mostra-o à saciedade: quando o responsável deixa de agir sem as reservas que um próximo sufrágio requer, acontecem as decisões que revelam o sentido mais corajoso no carácter dos humanos.

 

Se conhecemos deputados que repetem mandatos sem fim o que é que podemos esperar? Dá ideia, que se norteiam por uma espécie de disciplina que os deixará a salvo na integração das listas para o sufrágio seguinte.

 

Já no caso dos membros dos Conselhos Executivos a situação tem contornos nada surpreendentes se se considerar a situação pantanosa em que vamos vivendo.

Mais do que profissionalizar ou não a gestão das escolas, interessa que as comunidades possam eleger os melhores professores numa lógica de limitação de mandatos.

 

E digo os melhores profissionais com toda a convicção: são os que exercem superiormente as funções de gestão e direcção e são aqueles que nunca se refugiam no vergonhoso argumento (muitas vezes ao fim de pouco mais de meia dúzia de anos de exercício, pasme-se) de já não serem capazes de leccionar ou de por ali ficarem até que a reforma dê sinais de vida. Quem não sabe leccionar não pode dirigir uma escola. É até espantoso o modo como os nossos dirigentes se apropriam dos lugares.

 

Em todo este processo que estamos a viver, constatou-se que foram esses os primeiros a propalar a exequibilidade daquilo que depois se percebeu ser inaplicável. E decidiram assim, porque na maioria dos casos enredaram-se num sistema de pequenos favores que os obrigou, e obriga, a nortear a sua acção debaixo duma síndrome medrosa (dá ideia que se assustam com a própria sombra) que se alastra às suas comunidades (e que faz sofrer os que pugnam pela nobreza do exercício profissional). Nada que a limitação de mandatos não resolvesse; e decretada com efeitos retroactivos. Os professores e a Educação só tinham a ganhar com esse decisão.

 

Bem sei que este tipo de argumentação divide. Que seja. A unidade é um valor precioso, mas quando se trata de vazar o pântano, só nos resta separar as águas. Já sabemos que é assim e não vem mal nenhum ao mundo.

 

No caso dos Conselhos Executivos esperemos, então, pela próxima reunião.

 

E já se sabe: a luta continua em diversas frentes e segue dentro de momentos.

 

a luta segue dentro de momentos (1)

10.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

Começa a ser demasiado repetitivo desconstruir as políticas deste ministério da Educação. 

 

A luta dos professores portugueses, que já se arrasta há quase dois anos, conhece episódios a um ritmo quase diário; e tem tipo sempre o mesmo tipo de epílogo: os professores dizem que assim não pode ser e o governo contraria com pompa e veemência: passam uns tempos e lá vem o governo dizer que afinal estava errado e que vai fazer as necessárias alterações. Mas nada de substancial acontece: as mudanças, de cosmética, acabam por revelar ainda mais injustiças e inexequibilidades. Até quando? Já se viu que os professores não desistem: e não desistem porque não podem: ninguém, com um mínimo de profissionalidade, consegue adequar o que é inaplicável. É caso para dizer: o que nasceu tão tortinho nunca mais se endireitará. E depois existe o chorrilho de brutais injustiças que o ECD criou.

 

Hoje conheceu-se mais um episódio. Fica a ideia que a luta segue dentro de momentos.

 

 

Ora leia.

 

Presidentes de escolas do Norte e Centro vão entregar à ministra manifesto sobre avaliação.

Santarém, 10 Jan (Lusa) — Os 139 presidentes de órgãos de gestão de escolas hoje reunidos em Santarém decidiram elaborar um manifesto, a entregar “pessoalmente” à ministra da Educação, contendo a sua posição sobre o modelo de avaliação dos professores.

Numa reunião em que chegou a ser “ponderada” a demissão em bloco de todos os presidentes de conselhos executivos (PCE) presentes, estes acabaram por decidir deixar essa discussão “para outra altura”, nomeadamente para o caso de a resposta ao seu manifesto não os deixar “mais tranquilos”.

Maria João Igreja, presidente do conselho executivo do Agrupamento de Escolas Alexandre Herculano, de Santarém, disse, no final da reunião, que se prolongou até cerca das 18:00, que os PCE decidiram “reforçar a posição do Conselho de Escolas, pedindo a suspensão do modelo de avaliação”.

Este pedido sustenta-se no facto de considerarem que “não é possível levar [este modelo] por diante, mesmo simplificado, porque recaiu nos conselhos executivos todo o trabalho e responsabilidade de o aplicar e porque foi retirada a componente científico-pedagógica, que retira a essência da sua função”, disse.

Os PCE hoje reunidos em Santarém, provenientes de escolas do Norte e Centro do país, decidiram marcar nova reunião para 07 de Fevereiro, no mesmo local, para abordar “outros temas”, esperando ter “mais adesão”.

“Este encontro foi muito importante para dividirmos dúvidas e dificuldades e partilharmos o que uns e outros sabem”, disse Maria João Igreja, assegurando que, mesmo não se tratando de um movimento organizado, estas reuniões devem continuar para que “cada um não fique no isolamento das suas escolas”.

Maria João Igreja disse não ser possível apontar ainda uma data para a entrega do manifesto, que terá de ser primeiro elaborado e ratificado por todos os PCE presentes na reunião.

Interrogada sobre se, perante as dificuldades apontadas, ponderam não aplicar o modelo de avaliação recentemente promulgado pelo Presidente da República, Maria João Igreja afirmou que, embora não concordem, vão avançar com o processo porque os PCE têm a “obrigação de cumprir e fazer cumprir a lei”.

“Nenhuma voz se pronunciou contra a avaliação. Todas a consideram essencial, pela credibilidade do ensino, mas não este modelo”, afirmou.

Fernando Trindade, da Escola Secundária da Mealhada, afirmou que em questão está, nomeadamente, a “exequibilidade” do processo, pelas tarefas que são incumbidas aos conselhos executivos (CE).

Como exemplo deu o prazo de 15 dias para os CE se pronunciarem sobre os objectivos pessoais traçados por cada professor.

“Numa escola com 180 ou 200 professores, é praticamente impossível analisar e negociar todos, mesmo delegando competências, o que levará a que muitos possam ser aceites tacitamente, o que é perder o rigor” do processo, afirmou.

 

tristeza

10.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

Já por aqui dei conta da minha tristeza com as posições assumidas pelos deputados do partido socialista que tinham como actividade profissional a docência: enfim; muito francamente, nem sei se merece estar para aqui a descrever o que a maioria dos leitores já percebeu.

 

De uma coisa estou seguro: os professores mais atentos a estes assuntos jamais esquecerão os factos que têm ocorrido neste domínio.

 

descontentamento

10.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

 

 

Recebi um texto por email que guardei na pasta reservada aos documentos a publicar no blogue. É uma pequena parte de um estudo cujo autor desconheço (mas a fonte, que entretanto me escapou, era segura, se bem me lembro). É um texto que tem um conteúdo triste mas óbvio.

 

Ora leia.

 

"Quase 75 por cento dos professores mudavam de profissão se tivessem alternativa e 81 por cento admitem que, se pudessem, pediam a aposentação, mesmo com penalizações, segundo um inquérito a mais de mil docentes que será apresentado hoje.
Este é o melhor sinal da falta de respeito deste Governo (e de outros) por uma classe profissional que abrange mais de cem mil pessoas e é fundamental para qualquer "pogresso" ou desenvolvimento de qualidade de um qualquer país. Significa ainda, acima de tudo, uma falta de respeito, por todos os cidadãos de um país que esperam e desesperam pela melhoria sensível das condições de vida e revêem todos os anos, a tendência para o contrário".

uma leitura obrigatória

09.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

A escritora Lídia Jorge publica, hoje, dia 9 de Janeiro de 2008, um texto no jornal Público que me atrevo a considerar de leitura obrigatória.

 

Ora leia.

 

 

"A titularidade foi dada a professores bons, excelentes, maus e muito maus. Não premiou nada, porque baralhou tudo. Ficarão por muito tempo célebres os braços-de-ferro que Margaret Thatcher manteve com os sindicatos do Reino Unido, como conseguiu vencê-los, e como à medida que os humilhava, mais ia ganhando o eleitorado do seu país. Na altura a primeira-ministra britânica era a voz da modernidade liberal, criou discípulos por toda parte, e ainda hoje, apesar do negrume da sua era, há quem se refira à sua coragem como protótipo da determinação governativa. Mas neste diferendo que opõe professores e Governo, está enganado quem associa o seu perfil ao de Maria de Lurdes Rodrigues. Se alguma associação deve ser feita - e só no plano da determinação -, é bom que o faça directamente com a pessoa do primeiro-ministro.
De facto, a equipa deste Ministério da Educação tem-se mantido coesa, iniciou reformas aguardadas há décadas, soube transferir para o plano da realidade as mudanças que em António Guterres foram enunciadas como paixão, conseguiu que o país discutisse a instrução como assunto de primeira grandeza, fez habitar as escolas a tempo inteiro, fez ver aos professores que o magistério não era mais uma profissão de part-time, arrancou crianças de espaços pedagógicos inóspitos, e muitos de nós pensámos que a escola portuguesa ia partir na direcção certa. Quando José Sócrates saía com todos os ministros para a rua, nos inícios dos anos lectivos, via-se nesse gesto uma determinação reformista que augurava um caminho de rigor. Não admira que o primeiro-ministro várias vezes tenha falado do óbvio - que era necessário determinar quem eram, na escola portuguesa, os professores de excelência. Era preciso identificá-los, promovê-los, responsabilizá-los, outorgar-lhes credenciais de liderança. Era fundamental que se procedesse à sua escolha. Mas a sua equipa legislou sobre o assunto e infelizmente errou.

2.Errou ao criar, de um momento para o outro, duas categorias distintas, quando a escola portuguesa não se encontrava preparada para uma diferenciação dual. A escola portuguesa tinha o defeito de não diferenciar, mas tinha a virtude de cooperar. O prestígio do professor junto dos alunos e dos colegas não era contabilizado, mas era a medida da sua avaliação. Pode dizer-se que era uma escola artesanal que necessitava de uma outra sofisticação. Mas, para se proceder a essa modificação com êxito, era preciso compreender os mecanismos que a sustentavam há décadas, e tomar cuidado em não humilhar uma classe deprimida, a sofrer dia a dia o efeito de uma erosão educacional que se faz sentir à escala global. Só que em vez da aplicação cuidadosa e gradual de um processo de mudança, a equipa do Ministério da Educação resolveu criar um quadro de professores titulares, a esmo, à força e à pressa. No afã de encontrar a excelência, em vez de se aplicar critérios de escolha pedagógica e científica, aplicaram-se critérios administrativos, de tal modo aleatórios que deixaram de fora grande percentagem de professores excelentes, muitas vezes os responsáveis directos pelo êxito pedagógico das escolas.
O alvoroço que essa busca de um quadro de excelência criou está longe de ser descrito devidamente. Basta visitar algumas escolas para se perceber como a titularidade está distribuída a professores bons, excelentes, mas também a maus e muito maus, e foi negada a professores competentes. Isto é, criou-se um esquema que não premiou nada, porque baralhou tudo. Os erros foram detectados por muita gente de boa fé, em devido tempo, mas o processo avançou, a justiça não foi reposta, nem sequer a nível da retórica política. Pelo contrário, aquilo que a razão mostrava à evidência foi sendo desmentido, adiado, ridicularizado, ou desviado para o campo da luta sindical dita de inspiração comunista.

3.O segundo instrumento ao serviço da excelência não teve melhor sorte. Era preciso inaugurar nas escolas uma cultura de responsabilidade que até agora fora relegada para determinismos de vária ordem, menos os estritamente pedagógicos, o que era um vício da escola portuguesa, pelo menos até à publicação dos rankings. Mas aí, de novo, a equipa do Ministério da Educação funcionou mal. Se os campos de avaliação do desempenho dos professores estão mais ou menos fixados, e começam a ser universais, os parâmetros em questão foram pensados por mentes burocráticas sem sentido da realidade, na pior deturpação que se pode imaginar em discípulos de Benjamin Bloom, porque um sistema que transforma cada profissional num polícia de todos os seus gestos, e dos gestos de todos os outros, instaura dentro de cada pessoa um huis clos infernal de olhares paralisantes. Ninguém melhor do que os professores sabe como a avaliação é um logro sempre que a subjectividade se transforma em numerologia. Claro que não está em causa a tentativa de quantificação, está em causa um método totalitário que se transforma num processo autofágico da actividade escolar. Aliás, só a partir da divulgação das célebres grelhas é que toda a gente passou a entender a razão da pressa na criação dos professores titulares - eles estavam destinados a ser os pilares dessa estrutura burocrática de que seriam os pivots. Isto é, quando menos se esperava, e menos falta fazia, estavam lançadas as bases para uma nova desordem na escola portuguesa. Como ultrapassá-la?

4.Não restam muitos caminhos. Ultimamente, almas de boa fé falam de cedência de parte a parte. Negociação, bondade, comissões de sábios. A questão é que não há, neste campo, nenhuma justiça salomónica a aplicar. O objecto em causa não é negociável. Tendo em conta uma erosão à vista, só a Maria de Lurdes Rodrigues, que sabe que foi longe de mais, competiria dizer “Não matem a criança, prefiro que a dêem inteira à outra”, mas já se percebeu que não o vai fazer. Obcecada pela sua missão, que começou tão bem e está terminando mal, quererá ir até ao fim, mesmo que do papel dos mil quesitos que alguém engendrou para si só reste um farrapo. É pena. Depois de ter tido a capacidade de pôr em marcha uma mudança estrutural indispensável para a modernização do ensino, acabou por não ser capaz de ultrapassar o desprezo que desde o início mostrava ter em relação aos professores. E, no entanto, numa política de rosto humano, seria justo voltar atrás, reparar os estragos, admitir o erro sem perder a face. Ou simplesmente passar o mandato a outros que possam reiniciar um novo processo.
De facto, em Portugal existem vários vícios na ascensão ao poder. Um deles consiste em não se saber entrar no poder. Pessoas sem perfil técnico, ou humano, aceitam desempenhar cargos para os quais não foram talhados. Parece que toda a gente gosta de um dia dizer ao telefone, no telejornal, “Papá, sou ministro!”, com o resultado que se conhece. Outro é não se saber sair do poder. Houve um tempo em que Mário Soares ensinou ao país como os políticos saem no tempo certo, para retomarem, quando voltam a ser úteis. Os grandes políticos conhecem a lei do pousio. E o objecto da disputa deve ser sempre mais alto do que a própria disputa. É por isso estranho e desmedido o que está a acontecer.

5.José Sócrates deverá estar a pensar que pode ter pela frente um golpe de sorte - Margaret Thatcher teve a guerra das Falklands - e até pode vir a ter uma maioria absoluta outra vez. Aliás, pelo que se ouve e vê, a frase da ministra da Educação “Perco os professores mas ganho o país”, cria efeitos de grande admiração junto duma população ansiosa por ver braços-de-ferro no ar, sobretudo se eles vierem do corpo de uma mulher. Não falta quem faça declarações de admiração à sua coragem, como se a coragem prescindisse da razoabilidade. E até é bem possível que a Plataforma Sindical um dia destes saia sorridente da 5 de Outubro com um acordo qualquer debaixo do braço, como já aconteceu.
Mas a verdade é que, a insistir-se neste plano, despropositado, está-se a fomentar uma cadeia de injustiças e inoperâncias que só a alternância democrática poderá apagar. Se José Sócrates pediu boas soluções e lhe ofereceram estas, foi enganado, e deveria repensar nos seus contratos. Mas se ele mesmo acredita neste processo kafkiano, é uma desilusão, sobretudo para os que confiaram na sua capacidade de ajudar o país a mudar. Neste momento, entre nós, a educação tornou-se uma fábula".

dias alegres (3)

07.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

Há um aspecto nas posições que a minha escola tem assumido nesta luta dos professores que me deixa particularmente orgulhoso por pertencer a uma instituição com aquela cultura de liderança e de responsabilidade.

 

Antes de ir directamente ao assunto quero sublinhar o seguinte: no seguimento da publicação da primeira versão do modelo de avaliação dos professores, todos têm bem presente o que se passou: houve uns quantos que começaram por dizer que a coisa era monstruosa e inaplicável e foram considerados uns hereges e que o não queriam era ser avaliados; como mais tarde se provou, tinham razão: não há hoje quem contrarie essa constatação; mais tarde, e após o entendimento entre o governo e os sindicatos de professores, passou-se o mesmo: existiu até uma primeira redução do modelo que deu no que deu: foi considerada, de forma quase unânime e até pelo próprio governo, como inaplicável; a situação actual é apenas uma repetição de cenas já nossas conhecidas, embora o modelo de avaliação esteja, se é que ainda era possível, mais inaplicável.

 

Voltemos então ao que me orgulha tanto na minha escola. Nesta instituição, todas as decisões de suspensão ou de não aplicação do modelo foram tomadas pelos avaliadores (professores titulares, obviamente) porque estudaram os assuntos e concluíram da sua completa inexequibilidade. Nada nesse sentido foi exigido aos professores avaliados. Os avaliadores assumiram a sua inteira responsabilidade, naturalmente. É claro que todos os professores da escola foram ouvidos e manifestaram a sua opinião. Mas não existiu uma única reunião geral de professores e os abaixo-assinados foram apenas sectoriais. Ou seja, os avaliados sentiram-se representados pelos responsáveis que elegeram e confiaram nas suas decisões. E como se viu, tinham razões para isso.

 

dias alegres (2)

07.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

 

O Agrupamento de Escolas de Santo Onofre, em Caldas da Rainha, onde sou professor, e depois de uma aturada e detalhada análise da nova legislação em vigor, decidiu não aplicar o modelo de avaliação do desempenho de professores. Esta decisão assenta nos já sobejamente conhecidos argumentos e inscreve-se, naturalmente, no critério de completa inexequibilidade do referido modelo de avaliação que, na opinião expressa pela totalidade dos membros, encontra agora detalhes que aumentam o já incomensurável volume de situações inaplicáveis.

 

A não aplicação foi decidida na reunião de 7 de Janeiro de 2009, do Conselho Pedagógico do agrupamento, num sufrágio por voto secreto, que registou a unanimidade dos 17 membros presentes.

 

Nesta reunião, foi apresentado o relatório do Conselho Executivo onde se relata com detalhe todos os aspectos que impedem a implementação do modelo, tendo, o referido órgão e por decisão tomada na sua última reunião ordinária, optado por não aplicar o diploma que regulamenta a avaliação dos professores, tendo, no entanto, requerido a aprovação do Conselho Pedagógico.

 

Importa referir que a tomada de posição do Conselho Pedagógico, fundamentou-se ainda nos estudos já realizados anteriormente, com destaque para a tomada de posição no mesmo sentido por parte da Comissão de Coordenação da avaliação do desempenho e dos diversos Conselhos de Docentes e de Departamento Curricular.

 

Todas as decisões estão devidamente fundamentadas e delas será dado conhecimento às entidades responsáveis.

 

A presidente do Conselho Executivo informou o Conselho Pedagógico que vai participar na reunião de presidentes de Conselho Executivo a realizar, em Santarém, no dia 10 de Janeiro de 2009.

 

ameaças

07.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

Só vou escrever sobre o assunto porque a luta dos professores assim o exige. Diz um dos secretários de estado da Educação do actual governo que nem lhe passa pela cabeça que as escola não cumpram a lei.

 

Mas aonde é que este senhor tem andado? Não reparou no estado de sítio que se vive? Se as escolas não se têm decidido a não cumprir a legislação sobre a avaliação do desempenho dos professores onde é que estávamos? Na minha opinião, e na do governo do partido socialista, estávamos numa situação ainda mais caótica.

 

Este senhor deveria era de agradecer às escolas portuguesas pelo facto de se terem decidido a não cumprir a lei. E mais: como já se viu, não há motivos para não continuarem a fazê-lo.

de copenhaga a estocolmo

06.01.09, Paulo Prudêncio

 

 

 

 

Recebi por email um texto apócrifo com matéria muito interessante. Vale mesmo a pena ler e, se for caso disso, divulgar. O texto traz como título "Travar para pensar". Muito oportuno.

 

Ora leia.


 

"Experimenta ir de Copenhaga a Estocolmo de comboio. Comprado o bilhete, dás contigo num comboio que só se diferenciava dos nossos Alfa por ser menos luxuoso e dotado de menos serviços de apoio aos passageiros.

A viagem, através de florestas geladas e planícies brancas a perder de vista, demorou cerca de cinco horas .

Não fora ser crítico do projecto TGV e conhecer a realidade económica e social desses países, daria comigo a pensar que os nórdicos, emblemas únicos dos superavites orçamentais, seriam mesmo uns tontos. Se não os conhecesse bem perguntaria onde gastam eles os abundantes recursos resultantes da substantiva criação de riqueza .

A resposta está na excelência das suas escolas, na qualidade do seu Ensino Superior, nos seus museus e escolas de arte, nas creches e jardins-de-infância em cada esquina, nas políticas pró-activas de apoio à terceira idade. Percebe-se bem porque não construíram estádios de futebol desnecessários, porque não constroem aeroportos em cima de pântanos, nem optam por ter comboios supersónicos que só agradam a meia dúzia de multinacionais .


O TGV é um transporte adaptado a países de dimensão continental, extensos, onde o comboio rápido é, numa perspectiva de tempo de viagem/custo por passageiro, competitivo com o transporte aéreo.

É por isso, para além da já referida pressão de certos grupos que fornecem essas tecnologias, que existe TGV em França ou Espanha (com pequenas extensões a países vizinhos). É por razões de sensatez que não o encontramos na Noruega, na Suécia, na Holanda e em muitos outros países ricos. Tirar 20 ou 30 minutos ao Lisboa-Porto à custa de um investimento de cerca de 7,5 mil milhões de euros não trará qualquer benefício à economia do País.

Para além de que, dado hoje ser um projecto praticamente não financiado pela União Europeia, ser um presente envenenado para várias gerações de portugueses que, com mais ou menos engenharia financeira, o vão ter de pagar.

Com 7,5 mil milhões de euros podem construir-se mil escolas Básicas e Secundárias de primeiríssimo mundo que substituam as mais de cinco mil obsoletas e subdimensionadas existentes (a 2,5 milhões de euros cada uma), mais mil creches inexistentes (a 1 milhão de euros cada uma), mais mil centros de dia para os nossos idosos (a 1 milhão de euros cada um).

Ainda sobrariam cerca de 3,5 mil milhões de euros para aplicar em muitas outras carências, como a urgente reabilitação de toda a degradada rede viária secundária".