Estava uma tarde de chuva. Fui a uma das pequenas salas do cinema da cidade onde vivo. Éramos uns quatro espectadores, se tanto. Fiquei sentado a meio da sala e não me posso queixar, embora a qualidade auditiva da banda sonora deixasse muito a desejar: e como isso é importante.
"As Bandeiras do Nossos Pais" começa com imagens duras sobre a segunda guerra: o género assim o exige, a guerra deve ser demasiado cruel para não ser retratada de modo tão despido; e contudo...
Quando na Europa a guerra já tinha terminado, os EUA e o Japão continuavam a travar uma sangrenta batalha pela soberania da ilha de Iwo Jima, traduzida pela icónica imagem de cinco marines a colocarem a bandeira americana no cimo do monte Suribachi. Em homenagem à ideia do filme, resolvi não escolher essa fotografia para ilustrar este meu escrito.
Clint Eastwood continua a afirmar-se como um grande realizador.
Partindo de um "best-seller" sobre a história, escrito por James Bradley - filho de um dos soldados -, o filme confronta-nos com a sabida injustiça sobre a ideia da guerra e das suas inesqueciveis sequelas.
Necessitamos de heróis e os mais desprotegidos pagam um preço fatal por isso. Mitificamos para sobrevivermos e fugirmos ao destino comum e nessa ansia, esquecemos que os actores do teatro de guerra só trazem sofrimento: um inabalavel sofrimento. Jovens inocentes, impreparados para o primeiro contacto, iludem-se e pagam bem caro o reverso da medalha.
Os mandantes, cobertos por um atroz formalismo - é fantástica e bem ilustrativa, a ideia de se ter que trocar a bandeira içada para que um general a possa guardar como troféu - sacrificando-se, por isso, mais umas quantas vidas -, atolam-se na lama que os há-de consumir.
Uma bela lição de vida, esta obra de Eastwood. Nem sou grande apreciador de filmes de guerra, tapo a cara nas cenas mais violentas, surpreendo-me sempre quando um filme destes é classificado para maiores de 12 anos, mas rendi-me à nobreza das ideias e à profundidade da sua construção. O filme toca no essencial: só começa a guerra quem nunca a vive.
A não perder.