centralismo e eleições locais
Há anos a fio que se ouve a retórica: as eleições autárquicas são locais, os partidos políticos passam para plano secundário e o que conta são as pessoas. Testemunhei o argumentário ao longo dos anos e sempre desconfiei desses atributos sedutores. É natural a componente local dos partidos, mas a clareza de propósitos é essencial para respeitar a inteligência dos eleitores.
Se escutarmos os chefes dos "partidos parlamentares" e a comunicação mainstream, verificamos que as eleições locais são exames para as lideranças nacionais e até para os governos. Há toda uma contabilidade centralista dos votos que vai muito para além da necessária articulação entre as políticas nos diversos patamares da administração do país. O jeito oportunista acentua, ou não, o critério.
Passos Coelho e António Seguro não escapam a esse desafio e isso condiciona o modo como os seus partidos se organizam. Não registo a existência do CDS. Mas os partidos de fora do "arco do poder" não dão exemplo melhor. O bloco de esquerda debate-se com a falta de quadros locais e recorre a uma espécie de "mini-dinossáurios-saltitantes". O PCP afirma o centralismo democrático, como ouvi há dias a Jerónimo de Sousa: "nas autárquicas vamos mostrar um cartão amarelo ao Governo".
Os movimentos independentes surgem, naturalmente, como uma resposta da democracia e com nuances para todos os gostos e feitios. Alguns revelam, também naturalmente, contornos irresponsáveis e até risíveis.
Um bom barómetro do estado do poder local é a generalização de orçamentos participativos. Quando os órgãos existentes não ouvem mesmo as pessoas e não têm cultura organizacional para resolverem os problemas, "passam" as responsabilidades. Essa espécie de populismo costuma ter maus resultados. O insucesso da ideia fragiliza a democracia representativa e abre a porta às ditaduras.