movimento apresenta queixa ao Ministério Público e à Comissão Nacional de Protecção de Dados
Post de Manuela Silveira obtido no facebook do movimento "Em defesa da Escola Pública no Oeste".
"Na semana passada o Colégio Rainha Dona Leonor/Grupo GPS "convocou" encarregados de educação das várias escolas públicas do concelho para lhes dar conhecimento do seu projecto educativo para o próximo ano lectivo.
Se tem legitimidade para o fazer? Sim, não fossem os seguintes "pormenores":
1- O crime de acesso (e uso) indevido de dados pessoais;
2- O estatuto de oferta complementar da rede pública que a lei lhe confere. (Entendam de uma vez por todas a legislação que enquadra os contratos de associação: o Estado não tem que financiar turmas que têm lugar nas escolas públicas. A liberdade de escolha dos pais está a ser posta em causa? De forma alguma. No caso de não quererem matricular os filhos nas escolas públicas, obviamente que podem escolher uma escola privada. Mas trata-se de uma opção entre público e privado. E, portanto, deverão fazê-lo a expensas suas. O dinheiro dos contribuintes paga o ensino de todos, não escolhas pessoais.)
3- A existência de princípios e valores fundamentais num Estado de Direito que devem ser preservados. Sobretudo pelas escolas. Porque não podemos tolerar que haja escolas (sejam elas quais forem) a recorrer a expedientes para “apresentar (vender) o seu projecto educativo” que nos deixem, a nós cidadãos, preocupados com o futuro da cidadania e da democracia.
Claro que apresentámos queixa ao Ministério Público e à Comissão Nacional de Protecção de Dados.
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Ao:
Departamento Central de Investigação e Acção Penal
Rua Alexandre Herculano, 60
1250-012 Lisboa
Caldas da Rainha, 15 de Julho de 2013
Exmos. Srs.
Os signatários - professores e encarregados de educação - vêm por este meio dar conhecimento dos seguintes factos que, salvo melhor opinião, incorrem no crime de acesso indevido a dados pessoais por parte do Colégio Rainha Dona Leonor, propriedade do Grupo GPS.
Em data que não podem precisar, mas que terá ocorrido entre 1 e 10 de Julho, algumas dezenas de pais e encarregados de educação, cujos filhos/educandos tinham concluído o 4º ano de escolaridade em várias escolas do concelho, foram contactados (por telefone e por telemóvel) pelo Colégio Rainha Dona Leonor para comparecerem numa reunião naquele estabelecimento de ensino, no dia 10 de Julho, destinada a apresentar o seu projecto educativo para o ano lectivo de 2013/2014 do 5º ano de escolaridade.
Os professores e encarregados de educação abaixo assinados nada têm contra a iniciativa de marketing subjacente a esta reunião. Mas questionam a forma como o Colégio Rainha Dona Leonor teve acesso a informações que constituem dados pessoais e que só poderão ser disponibilizadas mediante o consentimento inequívoco dos titulares desses dados: os números de telefone e de telemóvel e todas as demais informações necessárias à identificação de encarregados de educação de alunos que concluíram o 4º ano de escolaridade no presente ano lectivo.
Os signatários estão convencidos de que, apesar de só estar explícito o uso de números de telefone/telemóvel dos responsáveis por estes alunos, sem prévia autorização dos mesmos, o Colégio Rainha D. Leonor terá tido acesso a informação suficientemente abrangente para lhe permitir seleccionar apenas a que lhe interessava para o objectivo da sua acção promocional: o facto de serem encarregados de educação de alunos em condições de efectuarem matrícula no 5º ano de escolaridade.
Estas informações, não tendo sido disponibilizadas pelas pessoas a quem dizem respeito, só podem encontrar-se:
- Nas escolas frequentadas pelos alunos, no processo individual do aluno onde constam todas as informações pessoais e familiares, estando vinculados ao dever de sigilo todos os elementos da comunidade educativa que a elas tenham acesso.
- No Ministério da Educação, através da MISI (Gabinete Coordenador do Sistema de Informação do Ministério da Educação), tendo cada escola acesso reservado e acessível através de password.
- Eventualmente na Câmara Municipal das Caldas da Rainha, entidade promotora das AEC (Actividades de Enriquecimento Curricular disponibilizadas aos alunos do 1º ciclo) em todo o concelho.
Acresce que, além dos pais dos alunos que concluíram o 4º ano de escolaridade, também foram contactados profissionais (assistentes sociais/psicólogos) que são formalmente encarregados de educação de alunos que se encontram no Centro de Acolhimento Temporário das Caldas da Rainha. Tratando-se de crianças institucionalizadas, o acesso a esta informação é ainda mais restrito, uma vez que, em alguns casos, há processos em tribunal que envolvem os progenitores dessas crianças, devendo a informação sobre quem as tutela estar devidamente salvaguardada e não exposta a quem a pretende obter para angariar matrículas para um colégio privado.
As informações em causa constituem dados pessoais cujos titulares não autorizaram que fossem divulgados e utilizados numa acção de marketing do Grupo GPS.
A Constituição da República Portuguesa (CRP) contempla as seguintes garantias constitucionais no que diz respeito à salvaguarda da privacidade e dos dados pessoais dos cidadãos:
- 34/1 CRP: “O domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis”.
- 35/2 CRP: “A lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua protecção, designadamente através de entidade administrativa independente”.
- 35/4 CRP: “É proibido o acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excepcionais previstos na lei”.
Por outro lado, a Lei n.º67/98, de26 de Outubro, Artigo44.º, prevê que:
“1. Quem, sem a devida autorização, por qualquer modo, aceder a dados pessoais cujo acesso lhe está vedado é punido com prisão até um ano ou multa até 120 dias.
2. A pena é agravada para o dobro dos seus limites quando o acesso:
a) For conseguido através de violação de regras técnicas de segurança;
b) Tiver possibilitado ao agente ou a terceiros o conhecimento de dados pessoais;
c) Tiver proporcionado ao agente ou a terceiros benefício ou vantagem patrimonial.
Por tudo isto, os professores e encarregados de educação abaixo assinados, apresentam por esta via queixa contra o Colégio Rainha D. Leonor/Grupo GPS, solicitando que o Ministério Público investigue os factos acima descritos.
Prova:
- Inquirição, a realizar, dos encarregados de educação:
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- Inquirição, a realizar, dos signatários;
- Toda a demais prova que o Ministério Público entender pertinente produzir para o cabal esclarecimento dos factos.
Os signatários:
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